quarta-feira, 24 de março de 2010

NEM TUDO QUE SE OUVE FALAR EXISTE!

A finalidade maior da língua é permitir uma comunicação ampla e eficiente entre os indivíduos de uma mesma nação. Para isso, é necessário que haja uma estrutura básica a ser respeitada pelos falantes. Acontece, porém, que a obediência de todos é um ideal, pois há sempre espaço para as transgressões, as mudanças e as inovações, o que, inclusive, mantém a língua viva.
Na fala, ocorrem inúmeras alterações do padrão linguístico. Algumas são como epidemias: contaminam, rapidamente, uma grande quantidade de pessoas, que passam a usar determinadas estruturas de forma equivocada. Como se diz por aí: a moda pega. Aqui vão alguns exemplos desse fenômeno linguístico.
Antes só encontrada em situações muito específicas, a palavra “asterisco” tem sido muito utilizada hoje, em função do uso dos rádios transmissores, em cuja estrutura aparece tal símbolo, como, por exemplo, 24*33392 ou 24*33*392. O problema é que muita gente desconhece a forma correta e, na hora de informar o seu ID (código de identificação), tem dito erradamente “asterístico” (que não existe no Português!). O engraçado é que esse uso vai de encontro ao princípio de menor esforço do falante, o qual, nesse caso, preferiu aumentar o tamanho da palavra a pronunciá-la originalmente.
Com a falta de espaço nas cidades, é comum vermos condomínios com as moradias duplicadas, grudadas umas às outras. Ao contrário do que se ouve, essas casas são “geminadas” (palavra vinda do latim “geminare”, que quer dizer “duplicar”), e não “germinadas”. Observe que elas são iguais, como se fossem gêmeas (ou gêminas). Se pudéssemos plantá-las para que brotassem da terra, naturalmente, sem precisarmos gastar tanto dinheiro para adquiri-las, aí poderíamos dizer que eram “germinadas”. Será que alguém ainda acha que aquela frase da Carta de Pero Vaz de Caminha a respeito das terras brasileiras, na época do descobrimento, vale para a aquisição da casa própria: “E em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo”? Isso explicaria o termo “germinada”, pois era só plantarmos uma casa, e ela germinaria na terra que escolhêssemos.
Já que estamos falando de casa, o nome daquela janela com batentes móveis que permite a entrada de ar e de luz sem devassar o interior é “basculante”. Isso acontece pelo fato de ela possuir um “básculo”, ou seja, aquela peça móvel, apoiada num pino, que permite sua abertura e seu fechamento. O mesmo nome se dá ao caminhão que possui essa articulação. Ele também é chamado de “basculante”, uma vez que sua caçamba pode ser elevada para despejar o material nela existente, devido à presença dessa peça móvel. A forma “vasculhante” não existe, pode acreditar!
O que podemos observar é que algumas formas usadas incorretamente na fala passam a ser incorporadas também na escrita, causando grande confusão quanto ao emprego correto. Precisamos deixar nossos ouvidos e olhos bem atentos aos casos aqui mencionados, para que não “escorreguemos” na fala ou na escrita do dia a dia e manchemos nossa imagem de falante competente da língua portuguesa.


(Coluna “No quintal das palavras”. Artigo publicado no Lagos Jornal, Ano V, nº 480, Cabo Frio, quinta-feira, 23-7-2009, p.4)

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